sábado, 1 de dezembro de 2012

Acerca do amor livre: uma distinção importante


Defendemos a idéia do amor livre, como idéia de que o status quo dos relacionamentos afetivos "heterossexualidade monogâmica possessiva/ciumenta" é uma imposição que tira a liberdade das pessoas que querem viver outras formas de sexualidade e de relação afetiva. No entanto, nenhuma verdade é revolucionária se não desmente os enganos que porventura tentem acompanhá-la. Sendo inconiventes com as mentiras e injustiças que acompanham a luta pelo amor livre, vimos através deste fazer uma importante distinção acerca do amor livre.

Nem a monogamia é uma condição inevitavelmente aprisionante, nem a poligamia é garantia de liberdade. Um relacionamento poligâmico pode ser extremamente possessivo, cheio de dominação, corpos sendo tratados como propriedades. É como se a poligamia fosse uma condição de "propriedade de mais de um corpo". Assim também, um relacionamento monogâmico pode estar destituído de qualquer propriedade, de maneira que duas pessoas podem decidir que, apesar de livres para o que bem quiserem, querem apenas uma à outra. Só quem já viveu ou vive uma experiência poligâmica, sabe o quão é difícil administrar o relacionamento afetivo com mais de um ser humano. Afinal, é normal ter dificuldade pra lidar com um animalzinho tão complexo e surpreendente quanto o ser humano. Assim sendo, se fulana/fulano decide que não quer ninguém além de beltrana/beltrano, e vice-e-versa, isso pode não ser uma prisão, e sim uma opção compartilhada.

O acordo entre duas pessoas pode ser monogâmico ou poligâmico, e isso não é uma garantia de liberdade ou opressão.

Então distinguímos o eixo monogamia-poligamia do eixo perpendicular amor livre-amor possessivo, ok? Por favor, não prossiga a leitura antes de entender tudo o que está acima. Se preciso, releia antes de prosseguir.

Antes de apresentar a nossa tese, é preciso trazer mais um elemento: enquanto o eixo mono/poli diz respeito meramente à quantidade de pessoas que o pacto do casal permite de relacionamento (uma questão de acordo, de aliança, de pacto e respeito entre dois ou mais humanos), a questão do amor livre e do amor possessivo diz respeito exatamente ao que nos é inegociável. Somos radicalmente discordantes da possessividade no amor. Uma de nossas palavras de ordem é "Se não é livre, não é amor!". A idéia do amor livre é: Quem decide o que fazer com seu corpo é você, e não eu. Se você quiser fazer sexo com mais de uma pessoa, eu não posso fazer nada para impedir. Pode parecer surpreendente, mas essa idéia não é incompatível com um relacionamento monogâmico, o que dissemos acima já explica isso: se eu quero fazer com meu corpo apenas sexo contigo e você quer fazer do teu corpo apenas sexo comigo, nós podemos ter um amor livre monogâmico. Se um de nós dois quer outros corpos, e isso não acontece por causa da vontade do outro, essa monogamia já não tem mais tantos ares de liberdade. Assim sendo, a monogamia e o amor livre são compatíveis, apesar de contraditórios. A isso é preciso acrescentar que nem a poligamia nem o amor livre são garantias de liberdade. Nós, defensoras e defensores do amor livre, sabemos disso, e aquelas e aqueles que entre nós, não sabem, deveriam perder a ingenuidade e saber: a quem tenta deslegitimar o amor livre e a poligamia dizendo que não são garantias de liberdade, eu tenho uma triste notícia sobre o mundo real para lhes contar: não existe em canto algum garantia de liberdade, porque liberdade não se garante, liberdade se inventa e se reinventa a cada momento!

Estou dizendo tudo isso porque, apesar de pessoalmente não simpatizar mais com a monogamia como já simpatizei antes, e apesar de não querê-la mais de forma alguma em minha vida, acho que cada um tem o direito de fazer o que quiser de seu próprio corpo, inclusive monogamia. Se for uma monogamia de amor livre, melhor ainda, afinal, isso é possível. Mas é incoerente querer obrigar as pessoas ao amor livre: cada um tem seu tempo, o corpo tem a cronologia de sua pedagogia, e a gente aprende a conquistar a nossa própria liberdade. Caso contrário, é liberdade imposta, e aí não é mais liberdade.

Apesar disso tudo, acho que a poligamia é o terreno onde a liberdade do amor tem mais sentido de obter sucesso. Mas isso tudo é tentativa, e o tempo inteiro erramos, tentando viver a liberdade. É preciso estar preparada ou preparado para errar, lidar com o erro, levantar e tentar fazer diferente. Liberdade se constrói assim. No amor e em qualquer outra coisa da vida. Podendo exprimir livremente o desejo de amar quantos corpos queiramos, temos mais chance de viver de fato amores livres. ´por isso não sou entusiasta da monogamia, mas ainda assim escrevo este texto como colaboração para o movimento de luta pelo amor livre: a falsa verdade de que toda poligamia é livre, não é uma verdade revolucionária. Precisamos saber que a poligamia também pode acolher amores opressores, e assim teremos condições de lutar contra isso.

Agora posso apresentar a tese que sintetiza este redundante e importante texto: Apesar de a poligamia ser mais fértil para o amor livre do que a monogamia, tanto o amor livre quanto o amor possessivo podem ocorrer em ambos os terrenos, tanto no da poligamia quanto no da monogamia, e o critério básico e fundante de toda e qualquer liberdade (incluindo aí o amor livre) é o de que não sou dona ou dono do corpo de ninguém além do meu próprio, e de que ninguém é dona ou dono de meu corpo, a não ser eu mesma ou mesmo.

Mas é claro que tudo isso pode ser um grande delírio, portanto, peço comentários e críticas de quem tem teses diferentes ou semelhantes. O blog Artifício Socialista quer ser um grande laboratório de invenções do Amor Livre. Desde já agradecemos a sua colaboração.

beijinhos de maracujá!

5 comentários:


  1. Telmi

    Zé,acho que vc tem razão!

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  2. é.... tem gente que nem leu o testo direito e acha balela. Outras, estão com a mente totalmente lavadas com a falsa moralidade da Monogamia que acredita que a poligamia é coisa de Homem Safado e Vadias. Mas se olharmos pela perspectiva de dentro pra fora (sem falsos moralismos intelectuais), podemos encontrar algo que realmente faça sentido, e que nos remete a uma simples pergunta: Somos realmente felizes?

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  3. Penso que nos equivocamos em tentar colocar términos a tudo, e aí esta toda a confusão. Eu acho "poligamia" uma palavra ultrapassada, que diz mais sobre a situação anterior à nossa. Situaçao que apenas |_homens_ | tinha direito civil de "ter" mais de uma mulher. O que estamos vivendo hoje, uma ideia sem nome que existe faz tempo, permite a duas pessoas transarem pelo prazer que lhes dá o sexo e nada mais. Sem mentiras de amor, sem falsas promessas. O que as une pode ser uma relação amistosa ou uma coincidencia banal, qualquer coisa que faça duas pessoas está no mesmo lugar com a mesma sintonia. O sexo não passa de algo mais pra compartilhar. E se foi bom, porque não repetir. Sem necessidade de bagunçar suas vidas tentando solucionar em dupla um problema que não teríam em carreira solo :P. Cada dia as mulheres conquistam um espaço mais em direção ao igualismo, sendo a liberdade igual para todos como poucas vezes foi, o amor livre é uma realidade.

    E dentro dessa realidade o conceito de monogamia que entendi neste texto nao tem nenhum sentido. Se duas pessoas hoje estão muito bem juntas e não pensam relacionar-se com nenhuma outra pessoa, está bem. Mas e amanhã? E quando chegue o amanhã e se termine o desejo?
    Quando a ideia de monogamia nao caber mais na cabeça de ninguém, o fim do interesse de uma das partes jamais será um problema pra ninguém.

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  4. Compreendo que o amor livre é nossa capacidade em compartilhar interesses comuns entre duas pessoas se preocupando fielmente com o outro/a. O amor não aprisiona, é tolerante, é compassivo e profundamente leal. Se é amor é livre. A tese da monogamia não permite o amor é sim a passionalidade dominadora, que somente sobreviveu em função do machismo e do patriarcado. Mulheres e homens são livres e assim podem amar.

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