sábado, 11 de fevereiro de 2012

Sobre o conceito de radicalidade (ou O que é ser radical?)...



Quem me conhece, com certeza, sabe o que penso sobre radicalidade, mas talvez não saiba o que eu acho que a radicalidade NÃO É... Mas como eu acredito que este blog está fazendo algum sucesso junto a pessoas desconhecidas, vou dizer primeiro o que a radicalidade não é, e depois termino dizendo o que é radicalidade, para quem não me conhece e nunca me ouviu falando sobre isso!

1 - Radicalidade não é agressão, violência, destruição, vandalismo ou atitude criminosa.

As pessoas costumam dizer que um movimento vai radicalizar quando ele vai quebrar coisas, ou prejudicar pessoas. Essas atitudes não são necessariamente radicais, radicalidade não é sinônimo de crime, ou atitude condenável pela opinião pública.

É importante deixar claro que eu não condeno em si a violência contra a propriedade privada. Acho que a propriedade privada sim é que é uma violência, e acho que apesar de poder ser evitada em situação usual, a destruição de propriedade privada pode ser necessária em casos extremos. Quando é o único jeito de escapar da violência policial do estado, quando o nível de crime da burguesia contra o povo excede até mesmo o nível comum de crimes que a burguesia costuma cometer, pode ser que a violência contra a propriedade privada seja necessária. Assim também vale para a violência contra a polícia e contra o exército em casos de conflito extremo entre classes: é CLARO que queremos fazer revolução sem derramamento de sangue, mas a partir do momento em que conquistarmos a hegemonia política, ou seja, em que tivermos mais poder no nível formal, a burguesia vai querer COM CERTEZA lançar mão de sua hegemonia militar. Quando estamos sendo agredidos pela polícia e pelo exército da burguesia, pode ser que precisemos reagir. Não acho que o movimento que não é pacífico é em si descartável. Acho que em muitos momentos e inclusive na atual conjuntura, é necessário evitar a violência contra os militares e a propriedade privada, inclusive para a NOSSA preservação.

Mas essas duas atitudes: Violência contra a burguesia e a polícia burguesa (que são coisas diferentes, mas vale a mesma lógica); e violência contra a propriedade privada (principalmente a da burguesia), mesmo que sendo atitudes necessárias em caso extremos, ainda não são atitudes RADICAIS.

2 - Radicalidade não é loucura, descontrole, falta de inteligência.

Quando uma decisão põe em risco um movimento, seja ele um movimento científico-intelectual ou um movimento social e político, essa decisão não é radical, muito pelo contrário.

Em alguns casos, também extremos, é necessário tomar atitudes que nos colocam em risco. Mas se o movimento estiver correndo perigo de perder muita força ao nos perder, esse risco não é a tática mais inteligente. Só devemos nos arriscar em nome do movimento se soubermos que o movimento sobreviverá sem nós. Se eu farei falta para o movimento, e ele tem chances de acabar caso me perca, e eu me coloco em grande risco em nome do movimento, essa atitude é impensada, desinteligente, e não tem NADA de radical. Radicalidade não é burrice nem descontrole.

Mas é bom afirmar mais uma vez: há momentos em que é necessário que façamos sacrifícios. Muitas vezes eu posso morrer numa ação, mas o movimento sobrevive sem mim e o resultado da minha ação vai agregar força para o movimento, e neste caso, neste caso extremo, pôr a vida em risco é uma atitude que vale a pena. Mas hoje precisamos de cada pessoinha presente em nossos movimentos, então sacrifícios agora não seriam nenhum pouquinho inteligentes.

3 - Radicalidade não é dogmatismo, intransigência, engessamento.

Radicalidade não é falta de diálogo. É preciso haver sempre diálogo, é preciso que eu saiba submeter as minhas idéias e opiniões às críticas que vêm de outras idéias e opiniões. Minha idéia só é válida se ela sobrevive ao crivo das críticas. Se eu me nego a permitir que as minhas idéias sejam criticadas, se eu ignoro todas as críticas, se eu acho que minha idéia é uma verdade absoluta, e nunca faço o teste de submetê-la às críticas alheias, eu não estou sendo radical, eu estou sendo intransigente, dogmático. E isso NÃO É radicalidade.

É claro que não adianta nada eu ter idéias inconsistentes, não ser capaz de defendê-las. Não estou defendendo a falta de idéias. A crítica só é útil porque me ajuda a ver quais idéias devo abandonar e quais idéias vale a pena defender! Então a troca da verdade absoluta pela verdade relativa não melhora nada! O erro de achar que radicalidade é verdade absoluta faz as pessoas "combaterem o radicalismo" aderindo à verdade relativa, ou seja: tudo é verdade, nada é verdade, não existe verdade, todas as opiniões valem, ou todas as opiniões são apenas versões, pontos de vista, níveis de análise, e nada mais.

Se eu defendo minha idéia, é porque eu PERMITI que ela sofresse críticas, e as críticas não foram suficientes para me provar que minha idéia era equivocada. Toda vez que a crítica mostra o equívoco da minha idéia, eu mudo de idéia, e isso é muito bom! Mas só será completamente bom se eu, diante de críticas que não mostrem equívoco em minha idéia, CONTINUAR DEFENDENDO a minha idéia. Afinal, ela sofreu ao crivo da crítica.

4 - Então o que é a radicalidade?

Para responder a esta pergunta, vou reivindicar exatamente o que disse acima: a crítica! A crítica é um método para chegar à verdade, e verdade é a idéia menos equivocada possível sobre a realidade. A crítica se faz no diálogo, e é através do diálogo que idéias verdadeiras são construídas, e idéias equivocadas são superadas. Radicalidade não é dogmatismo, nem violência, nem burrice. Então o que é a radicalidade?

Radicalidade é ir à raiz das questões. Radicalidade é não ficar apenas na superfície, nas aparências, mas chegar, através da crítica, á raiz. Mas aí vocês vão pensar: radicalidade é cavar até chegar na raiz, no que está enterrado, no que está no centro da terra, abaixo da superfície?

Aí eu vou dizer: NÃO. A raiz é a essência, a raiz é o centro, mas essas três palavras não dizem respeito a um núcleo, nem a uma origem de processo linear. A raiz não é o começo, a raiz é TUDO. Raiz é a totalidade, entender a essência de uma questão é entender a questão em sua totalidade, articulada com tudo o que há. Por isso mesmo, aparência não é superfície no sentido da membrana de uma célula, por exemplo. Aparência é UM RECORTE da totalidade, ou seja, um recorte da essência. Essência é tudo e aparência é uma parte. Central não é aquilo em torno do qual tudo gira e constela. Central é o que atravessa todas as coisas, porque é essencial, porque está na totalidade das coisas. Radical é quem vai à raiz, ou seja, quem não entende as questões RECORTADAS da realidade como um todo. Radical é quem age a partir de um pensamento que compreende a totalidade das questões.

A radicalidade é a arma que temos para transformar o mundo, é a arma que temos para compreendê-lo, compreender como ele É, como ele PODE SER, o que PRECISA ser mudado e o que PODEMOS mudar. E o mais importante? COMO mudar.

Mas como radicalidade é totalidade, ela não fica só no entendimento de como mudar, ela precisa ter uma AÇÃO transformadora. E quem tenta entender o mundo na sua totalidade, tenta entender como transformar o mundo na sua totalidade, e tenta transformar o mundo em sua totalidade, pode receber a alcunha de RADICAL.

E este texto é um convite à radicalidade!

beijinhos de maracujá!

P.S.: Alini, companheirinha amada, obrigado por chamar a atenção no equivoco de digitação, já está corrigido. Agora a aparência e a essência voltaram aos seus devidos lugares!

2 comentários:

  1. Isso ae!
    Radicalidade é estratégia.
    A coragem deve estar a serviço da estratégia, e não a estratégia a serviço da coragem...

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  2. Esse seu texto respondeu algumas questões que me incomodavam, mas também instigou algumas dúvidas/curiosidades a respeito do tema RADICALIDADE em mim. O mais interessante é que antes, eu sempre associava RADICALIDADE com EXTREMISMO, agora noto a diferença ainda que para mim meio ofuscada.Ser radical, é ir às raízes da realidade, procurar a profundidade daquela situação e ser extremista é ver somente de um ângulo, não relevar outras possibilidades. Acho que é isso.

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