sábado, 6 de outubro de 2012

Carente e Carinhoso (ou Sobre os Medos Básicos e o Dar as Mãos)



Meu coração, não sei por que, é um músculo involuntário e, quando te vê, bate feliz, pulsa por você. Mas se eu fosse você, e soubesse o quanto sou tão carente e carinhoso, voltava a rir de mim, de novo.

Mas de uma coisa fique certa, amor, eu não preciso estar a toa pra você estar na mira, o meu olhar vai dar uma festa na hora e no dia em que eu estiver contigo e você estiver na minha. Sorrindo, te seguindo pelas ruas, sempre de portas abertas, esperando numa boa a hora de você chegar. É difícil de dizer.


Por algum motivo que eu não sei explicar, mas que a astrologia teima em dizer que vem da pose do sistema solar na foto do meu nascimento, sou extremamente vaidoso, carente e carinhoso. Sou a pessoa mais carinhosa do mundo, apenas por uma mania egoista de fazer para as pessoas o que gostaria que me fizessem. Esse é o motivo do amor das aquarianas e dos aquarianos pela humanidade: querer que a humanidade lhes ame.


Mas eu sou facilmente frustrável: fico esperando que as pessoas sejam tão carinhosas comigo quanto eu sou com elas. E quem disse que elas me pediram carinho? Eu é que sou oferecido. Sou o mais fácil de todas as esquinas deste planeta, basta passar por mim com uma piscadela, e eu me derreto feito um pote de Quali no asfalto quente sob o sol! Por isso mesmo, eu me fiz o fácil mais difícil de todo o planeta Terra, quiça de todo o Bairro das Flores: por dentro estou derretido, mas tão bem tampado que, mesmo derretido, tenho o mesmo formatinho de antes. Com a lua em peixes que tenho, acho que devo guardar em mim todos esses amores, e que apesar de cultivá-los, não são prioridades na minha vida. Não é que eu esteja esperando o dia em que estarei a toa, porque acho que amor não é como super nintendo, que só cabe uma fita depois que tira a anterior. As pessoas que eu amo não são cartuchos de super nintendo, e nem acho que o Super Mario World é a alma gêmea do Super Nintendo, como se fossem destinados um para o outro porque vieram juntos da loja. Mas também não é que eu esteja com medo de ouvir um não ou vários nãos, porque os ouço a todo momento, por toda canto, de todo jeito, em todos os timbres, entonações e situações. Não, não é medo de não. Não estou dizendo que os nãos me sejam prazerosos, mas já superei essa fase adolescente da falta de coragem que vinha do pânico de qualquer indício de rejeição, vivo de elaborar esse meu quíron na casa XI. Muito menos é uma coisa de que, por serem sempre mui amigas as minhas paixões, eu tenha medo de perder tais amizades. Se um dia uma amizade se desfizer porque não sobreviveu a uma declaração de amor, acho que foi tarde, tão imatura amizade.

E no entanto, com saturno em capricórnio (quase em sargitário, mas ainda em capricórnio), insisto em ser pote de Quali, no calor do sol no asfalto. Pote fechado. E o meu verdadeiro motivo é medo de sair de mim, sair de meu mundinho cheio de outras prioridades, e transformar essas aventuras platônicas em amores de verdade. Se você fosse eu, já tinha chegado em você. Mas aí: você não sou eu, se liga! Sendo você, você ainda não chegou em mim, então segura as ondas aí, vai!

Mas é isso mesmo: comodismo e conforto. Eu fico feliz em deixar as coisas ficarem do jeito que estão, pra ficar reclamando, que não chegam em mim, assim como eu não chego em ninguém. A psicologia do artifício precisa ouvir de Pichon o que ele fala sobre os dois medos básicos, que são o medo de perda (cômodo passado que se vai, como era gostoso aquele quentinho molhado lá dentro do útero da mamãe) e o medo de ataque (nunca fui lá fora, não sei que mundo é esse que me espera, depois que eu sair da perereca da mamãe! Vai que o mundo é um grande jacaré, crocodilo, dinossauro, dragão, camaleão de comodo, me esperando nascer pra me devorar inteiro, mastigar e engolir, com mil dentes!). Contra o risco de perder o útero, e contra o risco de sofrer o ataque do novo mundo réptil, o melhor artifício defensivo é a transparência: ficar na pré-tarefa, não estar de corpo inteiro, presença parcial. Se eu fosse você, já tinha chegado em mim.

E quem disse que eu só quero o que eu quero? Além dos medos básicos, outro motivo para eu não completar o que fazer diante do meu querer, pode ser o fato de eu ao mesmo tempo também não querer. Pensávamos que a melhor fórmula era aquela da lógica aristotélica, que a psicanálise teima que subverteu, mas herdou: "Quero, mas não quero querer". Um lado de mim quer, mas o outro quer não querer o que o primeiro lado quer. Mas percebemos que na verdade se tratava de algo um pouco mais difícil de explicar, e que demanda muita dialética, porque a contém em grande escala: "É óbvio que eu quero, mas eu não sei se eu quero". Não tem um querer querer, um não querer querer, nem um querer não querer. Tem dúvida sobre o que é óbvio, não há dois quereres diferentes que ficam até o final da equação, há um mesmo desejo dos dois lados da equação, que pode ser cortado pra simplificar, pra finalmente acabar com a confusão de que o centro da questão do inconsciente é o desejo. Não! É no campo dos saberes que está a contradição fundante de nossa psiquê, é no campo da certeza absoluta sobre o incerto, ou da dúvida profunda sobre o inquestinável. Não é porque o desejo está aí o tempo inteiro que ele é o centro de tudo.

Mas ele está aí o tempo todo, faz parte de cada uma das questões, podemos encontrá-lo por todo o lado. Aqueles dois franceses que escorrem pelo ralo sacaram que o desejo é multiplicidade. Mas a música brasileira explica muito melhor. Eu não tô nessa jogada, não tô nessa, não, senhor! Onde tem camaleão, lagartixa também muda de cor.

Tô precisando de outras companhias. Não melhores, porque as atuais são muito boas, mas companhias que me proporcionem mais adrenalinas, e não apenas que me deixem proporcioná-la. Sou vaidoso, gosto disso, mas também adoro massagear um bom ego e um belo umbigo. Companhias igualmente carentes, igualmente carinhosas. Não alguém que só me leve pelas mãos, mas com quem eu possa alternar essa tarefa. Enfim, pessoas com as quais eu possa caminhar de mãos dadas.

E finalmente, sair do estereótipo de não elaborar os medos de perda e ataque: cansei de ser o bonzinho que ajuda os outros a crescerem, agora eu quero ser grande e desliguei a moral que me servia de coleira. Sâo as outras galeras que têm que ter medo de perder pra mim e de que eu ataque. Eu sou o dragão que devora quem nasce.



E garanto que é uma delícia, ser minha refeição.

Viva a revolução!

beijinhos de maracujá!

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